O Silêncio Entre Dois Mundos
Neste texto íntimo e corajoso, compartilho um dos momentos mais desafiadores da minha jornada: quando tudo à minha volta seguia funcionando, mas por dentro eu já não me reconhecia mais. Entre o silêncio da alma e a vontade de recomeçar, escrevo sobre a dor da desconexão, a solidão da força constante e a esperança silenciosa de voltar a viver com verdade. Se você também sente que está entre mundos — o de quem você foi e o de quem está se tornando — talvez esse texto te abrace como me abraçou escrevê-lo.
SELF
Há momentos na vida em que tudo continua aparentemente igual — o lugar onde você mora, o trabalho que faz, os papéis que ocupa, as pessoas que te cercam — mas, por dentro, algo se desmancha em silêncio. E esse “algo” é justamente o que sustentava tudo: o sentido.
Nos últimos meses, atravessei esse lugar estranho. Um lugar onde a rotina acontece, mas a alma se cala. Onde o corpo cumpre compromissos, mas o coração assiste à vida como se fosse de fora. Um lugar onde você se pergunta, com dor, mas também com lucidez: “como cheguei até aqui?”
A resposta é complexa — e talvez seja assim para muita gente. Trabalhei minha vida inteira, fui tudo o que esperavam de mim. Fui forte, fui estratégica, fui incansável. Conquistei espaços, respeitei prazos, paguei contas, ajudei meus filhos, segurei minha família. Criei soluções, fiz conexões, cumpri promessas. E, no meio disso tudo… me perdi de mim.
Não foi de uma vez. Foi aos poucos. Uma vontade de não levantar. Depois, de não sair. Depois, de não falar. Um cansaço que não passava com o sono. Um silêncio que não era paz, era ausência. Um olhar no espelho que não se reconhecia mais.
Eu sentia que meu coração estava batendo, mas não conseguia sentir vida. Era como se eu fosse uma sombra de mim mesma, executando o que era preciso, mas sem emoção, sem entusiasmo, sem desejo.
E o mais difícil? As pessoas continuavam me admirando. Continuavam dizendo “você é incrível, forte, brilhante”, enquanto tudo o que eu sentia era: “eu estou me desfazendo por dentro”. A dor da desconexão interna é invisível — e por isso tão solitária.
Mesmo assim, segui. Porque não podia parar. Porque sou mãe. Porque sou o esteio da casa. Porque tem boleto, tem filho, tem mãe doente. Porque parar significava desmoronar uma estrutura que outras pessoas precisam para se manter de pé.
Mas chegou uma hora em que precisei olhar para dentro. Não por egoísmo, mas por necessidade. Porque a alma também adoece em silêncio — e, quando não cuidamos, ela nos abandona.
E foi aí que decidi começar — ou talvez, recomeçar.
Não com grandes planos ou promessas mágicas. Mas com uma única escolha: ser honesta comigo.
Assumir que estou cansada. Que me sinto perdida. Que já não acredito em muitas coisas. Que me sinto vazia. Que perdi a fé — e que, mesmo assim, ainda desejo reencontrá-la.
Resolvi escrever esse texto porque sei que muitas pessoas vivem essa dor. Um luto não declarado de si mesmas. Uma tristeza que não vira choro porque precisa continuar “funcionando”. Uma desconexão que se mascara em produtividade. Uma depressão que se disfarça de força.
Hoje, me dou permissão para dizer: não estou bem. Mas quero voltar a estar.
Quero me reinventar, me redescobrir, me permitir ser de verdade. Quero encontrar espaços onde eu me encaixe sem precisar me forçar. Quero construir uma vida que não precise ser sustentada por obrigação, mas por presença, propósito e paz.
Não tenho todas as respostas. Mas estou perguntando com coragem.
E esse já é um começo.
Estou reconstruindo minha fé — uma prece por vez.
Estou resgatando meu corpo — um banho por vez.
Estou cuidando da minha mente — uma conversa sincera por vez.
Estou sonhando com novos caminhos — um plano real por vez.
Talvez você também esteja nesse lugar.
E se estiver, eu te abraço daqui.
Não com pena. Mas com compreensão.
Você não é preguiçosa, fraca ou ingrata.
Você está cansada de carregar o mundo.
E a boa notícia é: você pode largar um pouco.
Respirar. E escolher, de novo.
Se você chegou até aqui, obrigada por me ler.
Obrigada por ser testemunha da minha tentativa de recomeço.
Porque sim, estou cansada. Mas ainda estou aqui.
E isso já é um milagre acontecendo em silêncio.
Com amor,
Sheila Costa

